o dEUs

Muitas vezes escrevo aqui diversos pensamentos que perambulam minha mente ao longo do dia. Pensamentos, opiniões, idéias –  expressões do eu, basicamente. Um eu-mosaico, de fato, numa mistura do que acredito, do que leio, do que me falam, do que aprendo. Um eu-bom, -ruim, -feio, -bonito -agradável, -sorridente, -angustiado, -obstinado, -inteligente e -etc, -etc, -etc…  No final são só vários ‘eus’. Queria poder hoje falar de muitas coisas sem este ‘eu’. Queria, como diz uma canção: ‘me esvaziar de mim’ e me preencher de coisas que nem sei se acredito, concordo,aceito, desejo. Escrever sem mim, sem a minha presença, sem a minha opinião, razão, argumento. É  claro, também, que não adianta transcrever um texto ou qualquer coisa do tipo. Eu queria experimentar estar aqui e escrever/apagar/escrever/apagar/escrever/apagar quantas vezes fosse necessário até que meu ‘eu’ explícito ou oculto d.e.s.a.p.a.r.e.c.e.s.s.e…

Como fumaça no vento…

Começando a jornada de exterminação dos ‘eus’, inicia-se a terceira pessoa  do singular que pode ser qualquer um e ninguém.

Às vezes, na construção das identidades neste mundo ( tantas são, de acordo com cada nome que se recebe: ‘filho’, mãe’, ‘namorado’, irmão’, etc… com cada grupo social que se está ligado: ‘professor’, feto_dedo‘cozinheira’, ‘torcedor’, etc..) surgem infinitos mosaicos do ser que estão em contínua exibição, tais como produtos em vitrines. Se está entre amigos, expõem-se  a pessoa tranqüila, camarada, cheia de intimidade e misturado as velhas, iguais e imbatíveis jocosas brincadeiras para passar o tempo. Se está na faculdade, apresenta-se o ser crítico, opinativo, argumentador, cheio de cautela intelectual e linguajar afiado. Se está sozinho, outro ser mais frágil e menos imponente se apresenta e reclama de si, justifica as falhas, se vê feio, bonito, interessante, desprezível. Enfim, o ser está sempre sendo, sempre almejando atuar no centro da vida, das vidas alheias, das vidas vizinhas, comadres, compadres, desconhecidas, estranhas. O ser está ali querendo sua própria presença para apresentar mais um fato, idéia, importância, relevância que permite mostrar mais o  ser ‘só sendo’. E este ser só se faz assim tão vivo e pleno por um caminho: o discurso. Escrito, oral, cibernético, imagético, o discurso nada mais é que dois seres ou mais querendo ser mais o centro , querendo ser mais a razão, o desfecho, aquilo que alimenta a idéia de querer sempre ser. Se expressar num discurso não é falar em si das coisas, do mundo, dos fatos, é só ser o ser. E este se constrói de maneira tal pela premissa da comparação. São nos processos de comparação que o ser se transforma para ser aceito, bem visto, ajustado as realidades. Ele compara e se ajusta para não sair do centro do discurso da vida.

É… o ser só quer ser ‘eu’, talvez para ser só dEUs.

 Aí vem o desafio: que tal tirarmos este ser? Assim como eliminei provisoriamente os meus ‘eus’?

Já experimentou se expressar sem você (no desejo ardente de ser aceito, amado, observado favoravelmente) estar presente?

Já tentou falar sem você estar presente no seu próprio discurso, sem opiniões, concordos e discordos variados?

Se se esvaziar, o que fica? Alguém fica? Há algo para ficar?

“Tal surpresa foi notar que pouco restou…”

(continua…)     

1 Response so far »

  1. 1

    Brahmarsi said,

    com muita paciência repetirei o que escrevi…

    Pensadores definem a presença dos “eus” como a simples EXPRESSÃO. Ser é expressar-se. Expressar-se é inflingir um grito no éter, afirmando que “AHAM” (EU SOU!). Retira-se isto, o que resta? Esta pergunta é muito pertinente.

    Com esta pergunta, adiciono outra e comentários para reflexão: Onde fica o amor nisso tudo?

    Exemplos de “não-eus” são as Gopis de Vrindávana. Meditar em o que falam, como caminham, como se sentam, o que pensam e o que fazem no geral. Seguir-lhes os passos é caminhar rumo ao sucesso do “não-eu”. Sussscesso porque, mesmo livres de “eus”, elas não perderam em momento algum Suas individualidades, suas características únicas e ETERNAS. Elas são o que são.

    É isto, rupanugi.
    Bejo.


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