Haiti, não há. Sem máscaras.

Cá estou eu pensando no Haiti. Cá estou tentando orar pelo Haiti. Cá estou eu tentando chorar pelo Haiti…. Mas não consigo.

Até hoje não derramei uma lágrima pelo Haiti, não me assustei com nenhum corpo haitiano que apareceu na TV, não me comovi com nenhuma lágrima, nenhum grito de horror e espanto de um povo sem casa, sem chão, sem comida, sem esperança.

E cá estou eu pensando… Porquê? Porque estou tão dura e inerte, tão insensível e tão indiferente a esta situação?

Gostaria de ter o desejo de sentir algo por essas pessoas.

Gostaria realmente que surgisse algum interesse em meu coração para olhar para elas e orar por elas, mas não há… basta o jornal mostrar mais uma cena da “catástrofe do Haiti”, basta a internet lançar mais uma “novidade” (‘Sobe o número de corpos encontrados depois do terremoto’) para eu mudar de canal, trocar de página, cantar uma canção, fazer outra coisa.

Não sei se vou conseguir explicar o que estou sentindo, mas simplesmente estou cansada de ter pena, de ter dó da humanidade.

Estou cansada de olhar pelo outro só na dor, na fome, no desespero, na morte.

Estou cansada de “salvar os fracos e oprimidos”, de fazer correntes de oração por eles, de desejar “dias melhores”.

Estou cansada desse fetiche que estamos alimentando em, a cada novo desastre, a cada novo inesperado acontecimento causado pelo homem, pela natureza, pelo dinheiro, pelas guerras, trocarmos nossas máscaras felizes e satisfeitas por máscaras tristes e desoladas.

A morte está entre nós todos os dias.

 A dor está entre nós todos os dias.

 O sofrimento, a tristeza, o desamparo, a fome, a sede, o ódio, o desespero está e sempre estará entre nós todos os dias!!!!

Porque estamos sempre querendo um alívio, um sofrimento “a menos”, uma dificuldade “mais fácil”? Não somos felizes na condição que estamos! Nunca! Nem com pouco, nem com muito dinheiro, nem com pouca ou nenhuma comida, nem com a mesa mais farta!

 Tudo é temporário.

Tudo se esvai no tempo.

Ou morre-se hoje, ou amanhã.

 Sofremos hoje pelo Haiti. Queremos o melhor pelo Haiti. Mas basta “tudo voltar ao normal” para esquecermos de toda pobreza, miséria que aquelas pessoas vivem. E elas vivem assim porque deixamos, porque queremos mais do que podemos, porque nos colocamos no centro do mundo, no centro de tudo que existe.

O Haiti precisa existir para que minha vida de pequenos luxos e comodidades permaneça. Existem milhões e milhares de Haitis espalhados pelo mundo existindo graças aos nossos hábitos, a nossa consciência de exploração de um mundo temporário.

Estes Haitis, graças a nós, nunca estarão livres dessa condição, por isso, hoje, meu único desejo não seria chorar por eles, mas encorajá-los a se libertar das garras dessa existência material, fruto das ganâncias e do egoísmo de tantos.

Gostaria de dizê-los que são seres perfeitos, eternos, bem-aventurados, à parte de qualquer dor que este corpo possa trazer.

Queria arrancá-los de suas dores e mostrá-los a beleza de serem além mente, corpo, sentidos e qualquer outra condição temporária.

 Não chore pelo Haiti, não ore pelo Haiti, não tenha pena do Haiti.

O Haiti é aqui (se você quiser).

O Haiti não é aqui (se você quiser).

1 Response so far »

  1. 1

    Jaqueline said,

    Estava conversando sobre o Haiti ontem e refletimos juntas que o sofrimento já existe há muito tempo ali… apenas aumentou, apenas piorou. mas daqui a algum tempo, não lembraremos mais do Haiti e de nenhum lugar que sofre tanto quanto lá. Lembramos da Àfrica e do nosso esquecimento diário…
    O Haiti apenas reflete toda a nossa ganância, toda a monstruosidade de que somos capazes por causa de dinheiro e poder.
    O Haiti não vai melhorar depois desta tragédia. Daqui a alguns dias não nos lembraremos mais dele… continuaremos atrás apenas dos nossos desejos e esqueceremos do quanto somos mínimos; tão pequenos que a natureza nos machuca e nos mata com facilidade.


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